segunda-feira, 16 de janeiro de 2017

Trecho do livro “Conversas com um jovem professor“, de Leandro Karnal:

A aula

Do ponto de vista prático, uma boa aula é um cruzamento de quatro linhas de força. A primeira diz respeito a você. A segunda é o conteúdo em si. A terceira está nas condições externas (ambiente, barulho externo, iluminação, calor, conforto da sala etc.). A quarta e mais importante diz respeito aos alunos.

Primeira linha: você

Digamos o óbvio: você é, como todo ser humano, um elemento variável. Há dias bons e ruins. Há biorritmos: tenho colegas que adoram dar aula à noite e eu amo sempre dar aula no primeiro momento da manhã. Há problemas pessoais que interferem na sua atuação profissional. Com o tempo, você perceberá que há infecções específicas do magistério, como a “outubrite”, mal que acomete educadores quando o ano está no fim. Não tem jeito. Não somos robôs. Tenha sempre presente: você varia muito e seu aluno ainda mais. Entenda um pouco esse ritmo. Mas há um recurso para enfrentar essas oscilações. Antes de começar a jornada de trabalho pense: como estou hoje? Estou bem? Ótimo. Estou ansioso ou angustiado com a conta de luz que não consegui pagar? Tente afastar esse pensamento de forma prática: depois da aula, eu verei isso. Estou com um pouco de dor de cabeça? Posso resolver uma indisposição com algum remédio? Essas perguntas são importantes porque a consciência de um mal-estar ou de uma aflição costuma diminuir o controle que essa angústia tem sobre mim. Aprenda a se conhecer. O sintoma mais normal (e ruim) de quem não se conhece bem é a reação excessiva a coisas pequenas. Um aluno não abriu o livro na página certa e você teve vontade de matá-lo? Isso é um sintoma. É muito sábio ter um pouco de consciência sobre seu estado de ânimo para ser, no mínimo, justo com os alunos e, no máximo, eficiente como profissional.

Segunda linha: conteúdo

A segunda linha de força é o conteúdo em si. Existem programas, livros, apostilas, coordenadores, vestibulares e muitas variáveis que nos fazem, permanentemente, parecer atrasados com o conteúdo. Não importa o quanto você corra: na última etapa, com frequência a mais interessante, você está defasado. Para piorar: tudo e todos retardam o avanço do conteúdo. Avisos da direção, indisciplina, feriados e um mundo infinito de coisas que acontecem na sua aula e que impedem de falar ou de ensinar.
Planeje a quantidade de conteúdo que permita uma aula produtiva. Dar demais ou de menos atrapalha o ritmo dos alunos. Se sua aula tem 45 minutos, digamos, pense que quase 15 (geralmente mais) serão perdidos nos bueiros da chamada, indisciplina, avisos, mãos que se levantam para ir ao banheiro etc. Então, imaginando que todo conteúdo deve fazer link com o que você deu na aula anterior naquela turma (lembre-se de que o aluno acabou de sair de uma aula sobre Tabela Periódica e está entrando numa sobre Império Bizantino), que este link demore uns cinco minutos e que você precisa reservar uns cinco minutos para fechar o conteúdo retomando conceitos centrais e reforçando o que foi dado restam… vinte minutos de aula. Evite começar lento e começar a correr quando o tempo se esgota. A técnica não pode ser superior ao conteúdo: você não pode passar mais tempo escrevendo do que explicando, mais tempo montando data-show do que analisando e mais tempo removendo cadeiras para um debate do que realizando o evento. 
                                                         Escrito por Leandro Karnal 
                                                                                      http://www.editoracontexto.com.br

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